
Estudantes e profissionais de Psicologia ouvem demandas de indígenas de Mato Grosso
As formas de atuação da psicologia foram debatidas por lideranças indígenas e pesquisadores indígenas no seminário realizado pelo Laboratório de Comunicação, Ciência e Tecnologia (Labtecc), da Universidade Federal de Mato Grosso, em conjunto com o Conselho Regional de Psicologia (CRP 18-MT), esta semana, em Cuiabá.
Na plateia, ouvidos atentos de estudantes e profissionais de Psicologia imbuídos do propósito de iniciar um movimento para que as teorias na área e a atuação avancem para o estágio em que a Psicologia seja feita pelos indígenas, que eles sejam os protagonistas. As mesas e atividades do seminário foram conduzidas pelos representantes indígenas.
“O que observamos a partir do levantamento das pesquisas e das práticas é que o que vem sendo produzido é uma Psicologia para os povos indígenas e não Psicologia pelos povos indígenas. O convite do CRP é para uma análise, estudo e proposta sobre como pode ser construída uma Psicologia junto com os povos indígenas e isso ser efetivado em ações futura do Conselho”, afirmou a presidente do CRP 18-MT, Morgana Moura.
A demanda por saúde mental dos povos indígenas existe e é evidente, mas a Psicologia ainda não consegue chegar até lá. Esta avaliação é da liderança indígena Soilo Urupe Chuê, 33 anos, da etnia Chiquitano, na Terra Indígena Vila Nova Barbecho, em Porto Esperidião. Ele foi o mediador da discussão onde foi apresentada a grave situação pela qual o povo Chiquitano passa por encontrar dificuldades de acesso à matéria-prima essencial para manutenção da cultura desses indígenas: o barro. O material é usado pelas mulheres para confecção de artefatos domésticos e artesanato de grande importância cultural para a comunidade, mas o local onde o barro é coletado ficou de fora dos limites da terra demarcada para o povo Chiquitano.
A situação pela qual os Chiquitanos passam é um exemplo de como o contexto em torno dos povos indígenas afeta a condição de saúde mental. “O contexto de conflito agrário, de falta de demarcação de territórios tradicionalmente ocupados, a falta de recursos naturais em decorrência da devastação ambiental são causas de extremo sofrimento para os povos indígenas. Não basta o diagnóstico da doença, tem que haver um entendimento do contexto da vida do indígena”, analisou Soilo.
O psicólogo Thiago Kapovi, indígena Kurâ-Bakairi, é o primeiro psicólogo indígena registrado Conselho Regional de Psicologia de Mato Grosso. Ele concorda com a necessidade de entendimento do contexto da vida dos povos indígenas. “Saúde mental em contexto indígena é diferente. Cultura, dança, rituais e o modo de viver devem ser levados em consideração na atuação da psicologia”, afirma o psicólogo que atualmente trabalha na escola da aldeia Pakuera, em Paranatinga. “O profissional tem que interagir com a comunidade e participar da vida social. Tem que conviver e não viver entre”, conclui Kapovi.
“Quando retomamos historicamente as práticas da Psicologia, ela é colonial, a partir de uma epistemologia europeia. Se pensarmos na história da Psicologia e seu processo medicalizante e patologizante, a gente avalia que tem dívida história com esses povos e é essa dívida que estamos tentando sanar”, ponderou a presidente do CRP de Mato Grosso.
Fonte: Pau e Prosa Comunicação
Foto: Gilson Costa
Foto: Gilson Costa